Livro “Languas indagenas: tradia§a£o, universais e diversidade†apresenta as quase duas centenas de idiomas falados no Brasil por tribos indagenas
andios da etnia Waiapi osFoto: Heitor Reali/IPHAN/iphan.gov.br
Apesar de ser praticamente homogaªneo em todo o territa³rio nacional, apenas com distinções de sotaques e regionalismos dependendo do local onde éfalado, o portuguaªs praticado no Brasil não éa única langua dopaís. Além do portuguaªs oficial, hámais de uma centena de languas faladas em nosso territa³rio. Sa£o as languas indagenas, que correm sanãrios riscos de desaparecer nos pra³ximos 100 anos, caso siga-se uma tendaªncia: diminuição do número de falantes e com as criana§as já abandonando o aprendizado nas comunidades.
Esses riscos não se restringem apenas ao seu desaparecimento. Por serem languas a¡grafas, ou seja, de tradição apenas oral, e não escrita, quando essas languas morrem também se va£o toda uma tradição hista³rica secular contada oralmente, de geração a geração, de cla£ para cla£. Estima-se que antes da chegada dos portugueses no Brasil, havia entre 600 e mil languas sendo faladas pelos nativos indagenas. Hoje, existem um total de 154 languas indagenas faladas no Brasil. O Livro Languas indagenas: tradição, universais e diversidadeâ€, de Luciana Storto, professora do Departamento de Linguastica da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, traz um apanhado dessas languas, bem como o aprofundamento linguastico das principais famalias identificadas e agrupadas. O livro tem duas premissas imediatas: informar os resultados de pesquisas recentes sobre languas brasileiras ao leitor leigo, chamando sua atenção, e estimular o surgimento de novos estudiosos e ativistas das languas indagenas.Â
Essas 154 languas são agrupadas em famalias. Algumas delas podem ser formadas por subfamalias, pequenas ou grandes. Como exemplo de famalias linguasticas grandes temos a Tupi, Macro-Jaª, Aruak, Karib e Pano. Já as de famalias pequenas são as Yanomami, Naduhup e Nambikwara. Um fato interessante éque a subfamilia Tupi-Guarani, apesar de grande, não éconsiderada uma famalia. Ela possui 40 languas ou dialetos identificados no Brasil e nospaíses adjacentes, oriundos da langua-ma£e Proto-Tupi Guarani.
Apesar dessas divisaµes grandes, háfamalias menores formadas por uma ou duas languas no Brasil e também languas isoladas (não classificadas como relacionadas a nenhuma outra langua). Sa£o elas: Kana´e, Kwaza¡, Irantxe, Trumai, Tikuna, Ma¡ku e Aikana£. Ha¡ também duas languas crioulas, Galiba Marwa³no e Karipaºna do Norte, de base indagena no Amapa¡.Â
A obra possui ao todo seis capatulos que percorrem desde uma contextualização hista³rica atéas languas nativas do Brasil atualmente, passando pela sua diversidade cultural e linguastica, além da grama¡tica. Tudo muito bem detalhado e dida¡tico.
 Terras demarcadas e languas faladasÂ
Seria inevita¡vel para a autora falar desse tema sem tocar em um assunto importantassimo: o das terras demarcadas ou reservadas aos indagenas, que hoje representam 13% do territa³rio nacional. Um ponto abordado éo de que essas terras preservam outras áreas quando estãoem fronteira de floresta densa de difacil acesso como émuito visível nas imagens de satanãlite do norte de Ronda´nia. Isso quando as áreas preservadas não são praticamente as mesmas das reservas dos povos indagenas, como no Mato Grosso.
Mas um detalhe chama a atenção. Esses 13%, que podem ser considerados muito ou atémesmo contesta¡veis por certos setores da sociedade e atémesmo governamentais, são os responsa¡veis pela preservação das languas indagenas e da cultura de seus povos. Principalmente os amaza´nicos.
O número de falantes de languas nas tribos éincerto, mas Luciana apresenta números do linguista Denny Moore, que em 2011 publicou uma estimativa de 230.000 falantes. Moore édoutor em Linguastica e Antropologia Cultural pela City University of New York e também pesquisador volunta¡rio do Museu Paraense Emalio Goeldi. Tambanãm édele o critanãrio de inteligibilidade (que gera controvanãrsia, como aponta Luciana em seu livro), que possibilitou o ca¡lculo das 154 languas distintas faladas.
Moore também tabelou as populações chegando a um número de 485.576 indagenas. O Censo do IBGE de 2010 aponta 896.000. “Esse número contanãm alguns erros e não representa apenas a população que vive em terras indagenas, mas também aqueles em territa³rio urbano e os que se autodenominam como pertencentes a algum grupo anãtnico nativo do Brasilâ€, afirma Luciana no livro.Â
“Por um lado, cresce a população indagena muito pelo fato do avanço no acesso a atendimento de saúde, medicamentos e alimentação. Por outro, se diminui os falantes das languas nativas, porque estes abandonam suas languas com base na crena§a erra´nea de que para falar bem a langua portuguesa, eles precisam deixar de falar suas languas nativasâ€, escreve a autora.
O segundo capatulo seleciona três regiaµes do Brasil com diversidade linguastica considera¡vel. Sa£o elas o Alto Rio Negro (Noroeste Amaza´nico), o Sul de Ronda´nia (Sudoeste Amaza´nico) e o Parque Indagena do Xingu (Alto Xingu). Sa£o regiaµes pouco estudadas nas escolas, ficando de fora da história oficial dopaís. No livro de Luciana Storto, éapresentada mais da história dessa relação dos povos ali presentes e as suas languas.
Das três áreas, apenas o Alto Rio Negro éindiscutivelmente considerada a única área linguastica do Brasil, seguindo os critanãrios de ser uma regia£o onde languas de várias famalias tiveram contato por um longo período de tempo, além de adquirir caracteristicas em comum entre si. As áreas do Sul de Ronda´nia e do Xingu são candidatas a serem classificadas como áreas linguasticas também, devido sua diversidade e culturalidade. Quanto ao Xingu, revela-se de que já ali havia habitações desde o século 9. Sendo uma regia£o multicultural e multilangue, as tribos da regia£o compartilham inclusive rituais e cerima´nias com cantos cantados misturados nas languas das respectivas tribos em alguns dos rituais.
Os capatulos três, quatro e cinco dedicam-se a falar sobre a grama¡tica das languas indagenas brasileiras: apresentando a morfologia, sintaxe, sema¢ntica, pragma¡tica, fonanãtica e fonologia. Ha¡ aqui construções de frases e comparações entre languas, justificando as semelhanças entre as famalias e as languas-ma£es (que originaram as languas em questão).
No sexto e último capatulo, nomeado de “A arte verbal e as culturas de tradição oralâ€, há disposição de análises do que estãopor trás das narrativas contadas oralmente háséculos, destrinchando a arte verbal dessas culturas e reforçando a importa¢ncia de alguns rituais que tradicionalmente se perpetuam.