Humanidades

Um ano de COVID: entendendo um tempo 'estranho e não natural'
No ano passado, o Dr. Nicholas A. Christakis se esforçou para ajudar outras pessoas a entender a pandemia COVID-19.
Por Mike Cummings - 07/03/2021


Nicholas A. Christakis

No ano passado, o Dr. Nicholas A. Christakis se esforçou para ajudar outras pessoas a entender a pandemia COVID-19.

O médico e socia³logo de Yale escreveu colunas de opinia£o e tópicos populares no Twitter explicando os aspectos cienta­ficos e sociais do va­rus. Ele liderou uma equipe que desenvolveu o  Hunala , um aplicativo gratuito para smartphone que fornece instanta¢neos dia¡rios do risco pessoal e regional de contrair COVID-19. Ele atéescreveu um livro, “ Flecha de Apolo: O Impacto Profundo e Duradouro do Coronava­rus na Forma como Vivemos ” (Little Brown Spark), que examina a crise de perspectivas epidemiola³gicas, virola³gicas, sociola³gicas e hista³ricas.

Em uma conversa recente, Christakis, o Professor Sterling de Ciências Sociais e Naturais na Faculdade de Artes e Ciências, refletiu sobre o ano passado e compartilhou sua perspectiva sobre como o va­rus ira¡ moldar nosso mundo daqui para frente. A entrevista foi editada e condensada.

Em “Apollo's Arrow”, vocêfornece aos leitores uma perspectiva hista³rica sobre a pandemia. O que podemos aprender com a experiência da humanidade com pragas para nos ajudar a entender esses tempos difa­ceis?

Um argumento central do livro éque, embora a vida agora parea§a estranha e antinatural, na verdade éta­pica da experiência humana durante as pragas. As pragas não são novas para nossa espanãcie. Eles são apenas novos para  nos. Os humanos os confrontaram repetidamente por milhares de anos. Eles estãona Ba­blia. Homer e Shakespeare escreveram sobre eles. Achamos que éloucura e terra­vel ser reduzido a viver assim, mas nossa experiência atual ébastante ta­pica de pragas ao longo da história - e em muitos aspectos melhor. As pessoas se separam umas das outras e se agacham. A atividade econa´mica desacelera. Muitos de nosnos tornamos mais religiosos. Sentimos medo e tristeza, mas também bondade e generosidade.

Dado o que podemos aprender com a história, não acho que as pessoas devam apenas imaginar que iremos rápida e facilmente voltar ao normal. Enfrentamos um caminho desafiador, mas estou otimista de que eventualmente veremos o outro lado disso como sociedade. Uma certeza sobre as pragas éque elas sempre acabam.

Vocaª nota que as pragas trazem o melhor e o pior de nós. Olhando para o ano passado, e nossa resposta a este capa­tulo sombrio lhe da¡ esperana§a? 

Bem, principalmente, o va­rus éo vila£o desta história. Historicamente, em anãpocas de peste, as pessoas costumavam se comportar mal, e também vimos isso agora. Mas estou impressionado com as muitas coisas boas que estamos fazendo para combater o va­rus. 

Um dos argumentos que apresentei em meu livro anterior, " Projeto: As Origens Evoluciona¡rias de uma Boa Sociedade ", éque nossa espanãcie desenvolveu muitas qualidades maravilhosas: somos amigos e amamos uns aos outros, cooperamos uns com os outros, ensinamos e aprendemos de um para o outro. Essas são propriedades muito incomuns em animais, mas nosas temos.

Em “Apollo's Arrow”, mostro como o germe explora essas nossas tendaªncias inatas para formar tipos específicos de organização social. Pode-se argumentar que a disseminação de germes éo prea§o que pagamos pela disseminação de ideias. Os germes exploram nossas redes sociais. Se não fa´ssemos sociais, não haveria conta¡gio.

Então, vamos virar isso de cabea§a para baixo: a disseminação de germes éo prea§o que pagamos pela disseminação de ideias, mas éigualmente o caso que a disseminação de ideias nos permite lutar contra os germes. No momento, as pessoas estãotrabalhando juntas para implementar intervenções não farmacaªuticas, como distanciamento social e uso de ma¡scaras. Nossos cientistas estãocooperando e compartilhando informações em todo o mundo. a‰ precisamente a nossa capacidade de cooperação e aprendizagem que nos equipou com as ferramentas para derrotar a pandemia e minimizar seu tributo.

As redes sociais podem ajudar na divulgação das vacinas?

sim. Na verdade, fizemos alguns trabalhos em meu laboratório sobre o que chamamos de “conta¡gios de duelo” entre conta¡gios biola³gicos e sociais, entre germes, de um lado, e ideias e comportamentos, do outro. O va­rus se espalha de pessoa para pessoa - isso éum conta¡gio biola³gico. Tambanãm existe um conta¡gio social atravanãs do qual as ideias sobre vacinas (ou mascaramento) estãose espalhando de pessoa para pessoa. E cada um desses conta¡gios afeta o outro.

Em 2009, durante a pandemia de gripe H1N1, mostramos que a probabilidade de as pessoas serem vacinadas dependia de seus amigos terem sido vacinados e também de se seus amigos haviam contraa­do gripe. Da mesma forma, a probabilidade de as pessoas pegarem a gripe depende do fato de seus amigos a terem contraa­do ou de terem sido vacinados. Esses dois conta¡gios, o biola³gico e o social, afetam um ao outro.

Em certo sentido, enfrentamos a questãoagora de saber se nosso conta¡gio comportamental ultrapassara¡ o conta¡gio biola³gico. Podemos nos mover rápido o suficiente em nossos comportamentos sociais para interromper ou pelo menos reduzir o progresso do va­rus? Eu acho que podemos.

Considerando que temos várias vacinas eficazes em circulação, como vocêespera que o pra³ximo ano se desenrole?

Acho que ainda estamos no período inicial da pandemia. As pessoas precisam entender que vivemos um evento aºnico em um século. a‰ um milagre termos inventado uma vacina tão rapidamente. Somos a primeira geração de seres humanos que enfrenta a antiga ameaça da peste, que foi capaz de inventar contra-medidas especa­ficas na forma de uma vacina em tempo real. Isso éincra­vel. Mesmo assim, meio milha£o de americanos morreram. Atéum milha£o tera¡ morrido antes que a pandemia termine nos pra³ximos dois anos.

O coronava­rus nunca vai desaparecer. Mesmo quando vacinamos um grande número de pessoas, ainda havera¡ surtos. O pata³geno vai circular. E, como vimos, novas variantes surgira£o.

Acho que viveremos neste mundo estranho pelo menos durante este ano. Estaremos usando máscaras e evitando reuniaµes. Estaremos limitando as viagens. Escolas e empresas podem precisar fechar ocasionalmente. Mas, no final de 2021, alcana§aremos a imunidade de rebanho (onde o potencial epidaªmico do va­rus ébastante reduzido) - seja naturalmente por causa da disseminação do va­rus ou artificialmente por causa da adoção da vacina. E então, finalmente, deixaremos o impacto biola³gico e epidemiola³gico do va­rus para trás.

O que acontecera¡ quando alcana§armos a imunidade do rebanho?

Se vocêolhar todos os séculos anteriores de epidemias, então estãoclaro que teremos um período intermediário em que chegaremos a um acordo com o custo psicola³gico, social e econa´mico da pandemia. Acho que vai durar até2023, aproximadamente. Precisamos nos recuperar do terra­vel choque dessa experiência. Milhaµes de empresas fecharam. Milhaµes de americanos estãosem trabalho. Milhaµes de criana§as perderam uma quantidade significativa de aulas. Milhaµes de pessoas perderam parentes para o va­rus. Muitos tera£o deficiências crônicas por contraa­-la. Precisamos chegar a um acordo com todas essas coisas, o que levara¡ tempo.

Quando a vida voltara¡ ao normal?

Depende muito do que se define como “normal”! Acho que em 2024 - o momento não épreciso - entraremos no período pa³s-pandemia. E acho que vai se sentir um pouco como os loucos anos 20 do século passado. As pessoas buscara£o implacavelmente oportunidades sociais depois de ficarem confinadas por tanto tempo. Eles va£o se aglomerar em boates, bares, restaurantes, eventos esportivos, shows e festas. Podemos ver um aumento na licenciosidade sexual. E espero que a economia cresa§a e as artes floresa§am a  medida que nossa tendaªncia de socializar se extingue.

 

.
.

Leia mais a seguir