Humanidades

Modelo estata­stico mostra atribulada vida dos imperadores romanos
Ao estudar a trajeta³ria de 175 imperadores romanos, pesquisadores encontraram padraµes inusitados de sobrevivaªncia
Por Denise Casatti - 09/04/2021


Escultura do imperador romano Jaºlio Canãsar osImagem: Reprodução
 
Apesar de repleta de riquezas, mordomias e histórias para la¡ de picantes, a vida dos imperadores romanos sempre esteve por um fio, susceta­vel a s mais terra­veis traições e traganãdias que se repetiam ao longo do tempo. A maioria deles sofria morte violenta nos anos iniciais de reinado. Foi o que revelou uma pesquisa utilizando modelo estata­stico do Instituto de Ciências Matema¡ticas e de Computação (ICMC) da USP, em Sa£o Carlos, baseada na trajeta³ria de 175 imperadores romanos.

O professor Francisco Rodrigues, do ICMC, éum dos autores do artigo Power laws in the Roman Empire: a survival analysis (Leis poderosas no Impanãrio Romano: uma análise de sobrevivaªncia, artigo inanãdito ainda não revisado por pares), elaborado em parceria com o professor Francisco Louzada, também do ICMC, com o pa³s-graduando Pedro Ramos e com o professor Luciano Costa, do Instituto de Fa­sica de Sa£o Carlos (IFSC).

“Ao examinar o tempo atéa morte violenta dos imperadores, observamos que o risco éalto quando o imperador assume o trono. Esse achado pode estar relacionado a s dificuldades para lidar com as demandas que o cargo exige e a  falta de habilidade pola­tica do novo imperador. Nosso modelo sugere que o risco diminui sistematicamente atéatingir 13 anos de governo e, em seguida, aumenta rapidamente”, escrevem os pesquisadores no artigo. Cala­gula e Nero tiveram um reinado curto, sofrendo uma morte violenta. Por outro lado, Augustus governou por mais de 40 anos e morreu de forma natural; a chance disso ocorrer éestimada em torno de 24%.

Ha¡ várias hipa³teses que podem explicar esse ponto de mudança, em que a possibilidade de uma morte violenta volta a crescer. Por exemplo, após esse ciclo de 13 anos, éprova¡vel que os antigos inimigos do imperador tenham se reagrupado ou que novos inimigos tenham surgido. O interessante éque o estudo mostra também que, após esse ponto de mudança, o risco volta a diminuir.

Esse padrãoencontrado pelos pesquisadores, apesar de parecer aleata³rio, estãorelacionado a outros fena´menos como terremotos, flutuações nos prea§os das ações e ramificações em galhos de a¡rvores. a‰ como se houvesse uma espanãcie de “lei” regendo a vida e a morte dos imperadores: os reinados curtos são a regra; a exceção éa ocorraªncia de um reinado longo.

“Esse comportamento ésemelhante ao observado em muitos sistemas, incluindo terremotos, pois grandes terremotos são eventos raros. O resultado sugere que o tempo de vida de um imperador romano atéa morte violenta não tem uma escala ta­pica. O Impanãrio Romano anã, então, um exemplo de sistema que apresenta invaria¢ncias de escala, tal como ocorre com a distribuição de renda na sociedade, o tamanho das empresas e da população nas cidades, bem como a frequência com que palavras aparecem em um texto”, afirmam os autores.

Tempo de reinado dos imperadores romanos. A chance de sofrer uma morte violenta
aumenta assim que um imperador assume o trono e muda 13 anos depois do imperador
assumir o trono, quando a chance de sobrevivaªncia diminui
ainda mais rápido osImagem: Francisco Rodrigues
 
Com apoio da Fundação de Amparo a  Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp), o estudo contribui para lana§ar um novo olhar para as antigas civilizações, costumeiramente analisadas por historiadores, antropa³logos e cientistas sociais, mostrando que essas sociedades também podem ser compreendidas quantitativamente, por meio de modelagem matemática e computacional. “As antigas civilizações são exemplos de um sistema complexo composto por agentes que interagem, colaboram e competem por poder e recursos”, conforme explicam os pesquisadores.

Talvez, futuramente, esses tempos em que hoje vivemos também possam ser fruto de estudos quantitativos. Que tipo de padrãoos cientistas de amanha£ encontrara£o na nossa civilização? Sera¡ preciso esperar milaªnios para encontrarmos respostas ou as análises do passado também nos servira£o, em breve, para prever nossa sobrevivaªncia? Como a ciência émovida mais por perguntas do que por respostas, são podemos afirmar, com certeza, que ainda hámuito o que pesquisar para compreendermos as leis que regem nosso mundo.

“O que se pode afirmar éque, tal como nas civilizações antigas, os padraµes de comportamento de um grupo podem ser previsa­veis e surgem a partir das ações imprevisa­veis dos indiva­duos. As interações e decisaµes individuais influenciam a coletividade, criando padraµes que afetam todo o sistema, conclui o professor Rodrigues.

 

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