Humanidades

Refugiados e regimes de inclusão
A antropa³loga de Yale Marcia C. Inhorn coeditou o volume e contribuiu para uma recente edia§a£o especial da revista Anthropology of the Middle East, dedicada ao trabalho sobre populaa§aµes deslocadas.
Por Mike Cummings - 13/08/2021


(© stock.adobe.com)

Por um breve período em 2015, a situação dos refugiados que fogem de conflitos no Oriente Manãdio chamou a atenção do mundo. A ma­dia cobriu multidaµes de pessoas desesperadas cruzando o Mediterra¢neo em botes e barcos improvisados. Uma fotografia de partir o coração de uma criana§a sa­ria afogada, que morreu enquanto sua familia tentava chegar a  Europa em um barco infla¡vel, apareceu nas primeiras pa¡ginas e nos noticia¡rios em todo o mundo.

Os holofotes sobre os refugiados desapareceram rapidamente, mas a crise continua.

Em setembro de 2019, antropa³logos que estudam comunidades de refugiados em vários ambientes do Oriente Manãdio, Europa e Amanãrica do Norte se reuniram em Yale para uma conferaªncia organizada pelo Centro MacMillan para Estudos Internacionais e de area, o Conselho de Estudos do Oriente Manãdio e o Departamento de Antropologia. Um novo livro que surgiu da conferaªncia, “ Un-Settling Middle Eastern Refugees ” (Berghahn Books), baseia-se na pesquisa etnogra¡fica dos participantes para descrever as experiências, positivas e negativas, daqueles que fugiram da violência no Afeganistão, Iraque e Sa­ria , bem como outros conflitos na regia£o.

A antropa³loga de Yale Marcia C. Inhorn coeditou o volume e contribuiu para uma recente edição especial da revista Anthropology of the Middle East, dedicada ao trabalho sobre populações deslocadas.

Inhorn, William K. Lanman Jr. Professor de Antropologia e Assuntos Internacionais na Faculdade de Artes e Ciências, conversou recentemente com a YaleNews sobre as duas publicações. Entrevista condensada e editada.

O que motivou vocêe seus colegas a publicar o livro e a edição especial?

Em primeiro lugar, esperamos trazer alguma atenção renovada para a crise de refugiados no Oriente Manãdio. Existem 26 milhões de refugiados e 80 milhões de pessoas deslocadas a  força no mundo, e a maioria édo Oriente Manãdio. a‰ um problema sanãrio e que não estamos perto de resolver. Acho que os ocidentais se cansaram disso, mas precisamos prestar atenção a isso, pois as nações ocidentais, incluindo os Estados Unidos, desempenharam um papel importante na causa da crise.

Outro objetivo do livro ésimplesmente fazer um balana§o de como os refugiados estãose saindo. O que eles estãofazendo para promover sua própria causa? Como as pessoas nospaíses anfitriaµes estãorecebendo esses esforços? Como os hosts também estãofazendo esse tipo de trabalho?

Uma das mensagens mais positivas deste livro éque, embora existam muitospaíses que não tem acolhido refugiados - estamos chamando esses de "regimes de exclusão" - também existem muitos lugares que tentaram de várias maneiras incluir refugiados. Tentamos destacar o fato de que os pra³prios refugiados estãoexigindo suas boas-vindas e, em certo sentido, tem sido agentes ativos no que chamamos de “regimes de inclusão”.

Quais são alguns exemplos das histórias positivas descritas no livro?

Minha colega, Lucia Volk, que coeditou o livro comigo, documentou um campo de protesto que refugiados sa­rios iniciaram em Dortmund, uma cidade no noroeste da Alemanha, para defender seus direitos. Eles protestaram contra os atrasos no tratamento de seus pedidos de asilo. As autoridades locais foram aºteis, informando os manifestantes sobre as regras relativas ao fornecimento de barracas, comida e banheiros porta¡teis. A cidade inteira se reuniu quando eles montaram este acampamento e exigiram um processamento mais rápido dos pedidos de asilo. O protesto durou mais de 50 dias e teve um impacto.

Outro colega mostra que as autoridades de saúde canadenses criaram iniciativas dentro do sistema nacional de saúde dopaís para ajudar a atender a s necessidades dos migrantes deslocados e refugiados. Existem exemplos positivos como esse em todo o mundo.

Va¡rios capa­tulos descrevem casos de refugiados que cuidam de outros refugiados. Por exemplo, minha colega de Yale, Zareena Grewal, documentou um caso em que comunidades de refugiados estabelecidas na Granãcia criaram organizações que funcionam como agaªncias não governamentais locais que ajudam refugiados recanãm-chegados a se estabelecerem. Aqueles que viveram na Granãcia e ficaram mais a  vontade com o idioma e a cultura se esforçaram para ajudar seus companheiros refugiados. a‰ uma história edificante em meio a uma crise mais ampla.

Vocaª contribuiu com um capa­tulo do livro dedicado ao seu trabalho com comunidades de refugiados em Michigan. O que envolveu seu trabalho de campo?

Fiz um estudo de cinco anos na área de Detroit, trabalhando principalmente com refugiados da Guerra Civil Libanesa, mas também refugiados iraquianos. Muitos refugiados do Oriente Manãdio foram colocados em Detroit e seus subaºrbios porque éo maior enclave anãtnico a¡rabe dopaís, mas muitos refugiados que inicialmente foram enviados para outros estados acabaram se mudando para la¡ no que échamado de migração secunda¡ria. A área de Detroit ofereceu a eles uma comunidade que não existia nessas outras localidades.

Sinceramente, éuma população empobrecida. O pra³prio Michigan tem lutado. A indústria automobila­stica sofreu ao longo dos anos. E a crise financeira de 2008 atingiu duramente o estado e a cidade. Detroit estava no Capa­tulo 13 da falaªncia em 2013. Ainda assim, ela recebeu mais do que seu quinha£o de deslocados do Oriente Manãdio.

Entrevistei mais de 100 a¡rabes que fugiram do La­bano durante sua guerra civil de 15 anos ou do Iraque durante as duas guerras mais recentes la¡. As pessoas com quem falei estãolutando. Eu me concentrei particularmente em seus problemas de saúde. Sou um antropa³logo médico interessado em questões de saúde reprodutiva, o legado da guerra, as coisas que acontecem a s pessoas durante a guerra, como as pessoas se machucam e como sua saúde reprodutiva éafetada. Publiquei um livro, “ Refugiados arabes da Amanãrica: Vulnerabilidade e Saúde nas Margens ” (Stanford University Press), que acompanha refugiados em Detroit que sofrem de problemas de saúde reprodutiva que exigem fertilização in vitro.

Qual éa responsabilidade dos Estados Unidos e de outrospaíses ocidentais ao lidar com a crise dos refugiados?

a‰ muito importante considerar o papel dos Estados Unidos na criação da crise. Invadiu o Iraque duas vezes: uma em 1991 e novamente em 2003. Atéhoje mantanãm uma presença militar no Iraque. Acabamos de encerrar uma guerra de 20 anos no Afeganistão. Os Estados Unidos estãoenvolvidos militarmente na Sa­ria. Cada uma dessas intervenções éum dos principais impulsionadores da crise dos refugiados.

A menos que vocêfaz parte de uma familia militar e seus entes queridos sejam enviados ao Iraque ou ao Afeganistão, a maioria dos americanos não quer pensar nas consequaªncias dessas guerras. O livro, em alguma parte, tenta argumentar que os Estados Unidos e o Ocidente em geral precisam se preocupar mais com os refugiados porque estãomuito envolvidos na violência devastadora na regia£o. Temos a responsabilidade de ajudar aqueles que foram deslocados por essa violência.

Que tipo de boas-vindas New Haven ofereceu a  sua população de refugiados?

New Haven éum exemplo excepcional de comunidade acolhedora para refugiados. Temos uma a³tima agaªncia de refugiados aqui em  IRIS.  Pessoas em Yale, incluindo a faculdade de direito e a faculdade de medicina, tem feito um trabalho maravilhoso em nome dos refugiados. As organizações religiosas locais fazem um a³timo trabalho servindo aos refugiados. Existem Sanctuary Kitchen e Havenly Treats, que empregam mulheres refugiadas em empreendimentos relacionados a  alimentação. Apesar das muitas dificuldades enfrentadas por New Haven, a cidade tem um espa­rito inclusivo do qual todos nos beneficiamos.

 

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