Humanidades

Sanções econa´micas na Raºssia correm o risco de violar a lei internacional se levarem a  escassez global de alimentos
Embora a guerra muitas vezes cause insegurança alimentar aos estados beligerantes, a Raºssia éum ator importante na cadeia alimentar global. a‰ o maior exportador mundial de petra³leo para os mercados globais de energia...
Por Cristiane Derani - 13/04/2022


Imagem Internet

As sanções econa´micas aplicadas a  Raºssia osapesar de sua aparente legalidade ostornam-se incompata­veis com o direito internacional se causarem insegurança alimentar ao violar o direito humano de acesso a  alimentação,"

Cristiane Derani 

Uma das consequaªncias de qualquer guerra éa insegurança alimentar. Isso se deve a  quebra na cadeia alimentar e a  escassez de produção que atinge uma nação que sofre invasaµes ou que já estãosendo atacada por foguetes e canhaµes. No entanto, a decisão da Raºssia de atacar a Ucra¢nia apresenta algumas particularidades. Coloca os doispaíses na vanguarda da insegurança alimentar, impactando-os assim como a outras nações, embora a gravidade da insegurança dependa da capacidade de cadapaís de prover seu pra³prio povo.

Embora a guerra muitas vezes cause insegurança alimentar aos estados beligerantes, a Raºssia éum ator importante na cadeia alimentar global. a‰ o maior exportador mundial de petra³leo para os mercados globais de energia e um grande player na cadeia alimentar global como exportador e importador de alimentos, fertilizantes e outros produtos alimenta­cios.

"Esta guerra e as sanções impostas ira£o, portanto, espalhar uma onda de insegurança alimentar em todo o sistema interconectado de produção de alimentos do mundo."


A parceria entre o Ocidente e a Raºssia na cadeia alimentar global não énova. Em 1972, apesar da guerra fria, a ex-URSS e os EUA assinaram o Acordo Sovianãtico-Americano de Gra£os, marcando o ini­cio do que éhoje uma forte interdependaªncia entre as economias ocidentais e a Raºssia no sistema alimentar.

Mais recentemente, em 1997, a Raºssia e a UE assinaram um Acordo de Parceria e Cooperação (APC) bilateral, declarando o objetivo de desenvolver relações econa³micas mutuamente benanãficas. Hoje, a UE éum dos principais parceiros comerciais, importando trigo e gás e pagando mais de US$ 80 bilhaµes a  Raºssia . A escassez desses produtos resultara¡ em um aumento imediato dos prea§os, não apenas dos alimentos, mas do custo de todo o sistema alimentar, devido a  escassez de gás e combusta­vel.

Todo o sistema alimentar global também seráafetado, pois a falta de fertilizantes químicos importados da Raºssia pode gerar uma crise ainda mais grave do que a de 2008.

Sanções econa´micas e direitos humanos

As sanções econa´micas devem ser um instrumento para alcana§ar a paz. Seguindo a recomendação da Assembleia Geral das Nações Unidas (AG) (e apesar da ausaªncia de uma decisão do Conselho de Segurança) alguns estados decidiram declarar sanções econa´micas contra a Raºssia. Deve-se notar que uma Resolução AG aprovada em 2ndMarch lamentou veementemente a agressão da Federação Russa contra a Ucra¢nia, com o apoio de 141 Estados-Membros, e apelou também ao respeito pelas prática s humanita¡rias e pelos direitos humanos.

As sanções econa´micas que foram recentemente impostas contra a Raºssia estãode acordo com o direito internacional. Mas se levam a  insegurança alimentar e atéa  fome, são contra os direitos humanos e podem, portanto, ser vistos como ilegais.
O Comitaª de Direitos Econa´micos, Sociais e Culturais da ONU, que publica sua interpretação do direito internacional em relação a  economia e direitos humanos, disse em 1997 : de alimentos e a disponibilidade de águapota¡vel ”.

 Concluiu que:

“ Os habitantes de um determinadopaís não perdem seus direitos econa´micos, sociais e culturais ba¡sicos em virtude de qualquer determinação de que seus lideres tenham violado as normas relativas a  paz e segurança internacionais. O objetivo éinsistir que a ilegalidade de um tipo não deve ser combatida pela ilegalidade de outro tipo que não presta atenção aos direitos fundamentais que fundamentam e da£o legitimidade a qualquer ação coletiva .”


Nem todas as sanções econa´micas contra a Raºssia provavelmente levara£o a  insegurança alimentar. Mas as sanções financeiras e comerciais que afetam a produção e o consumo - devido ao aumento de prea§os ou escassez de materiais - em toda a cadeia alimentar global prejudicara£o gravemente o já fra¡gil equila­brio.

Os direitos econa´micos, sociais e culturais fundamentais da humanidade são reconhecidos como normas de direito internacional geral. O Tribunal de Justia§a Europeu considerou que estas normas constituem uma base para colocar limites ao princa­pio de que as resoluções do Conselho de Segurança tem um efeito vinculativo. Em outras palavras, algumas regras internacionais tem prioridade sobre outras porque afetam os direitos humanos da comunidade internacional como um todo. Qualquer decisão ou norma que os prejudique também prejudica todo o sistema de direito internacional.

A interdependaªncia global da produção de alimentos pode ser gravemente prejudicada por esta guerra e, consequentemente, também o direito humano de acesso aos alimentos.


O sistema alimentar global éindispensa¡vel para a manutenção e bem-estar da sociedade mundial e pode ser considerado um bem paºblico. Deve ser protegido por lei, e a oferta coletiva desse bem paºblico levanta problemas relacionados aos direitos humanos, especialmente o direito a  alimentação a prea§os acessa­veis.

"Em nosso mercado global interconectado, os alimentos são vistos por vendedores e fornecedores como uma commodity. Mas do ponto de vista da humanidade, o direito a  alimentação éum direito humano, e não pode estar sujeito aos interesses de Estados e corporações."

Cristiane Derani

 

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