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Visão da evolução dos ossos
Uma equipe conjunta de paleonta³logos analisou pela primeira vez estruturas ósseas em fa³sseis de 400 milhões de anos de vida marinha em alta resolua§a£o sem precedentes e em 3D.
Por Associação Helmholtz de Centros de Pesquisa Alemães - 31/03/2021


Impressão arta­stica do peixe placoderme que viveu 380 milhões de anos atrás. Crédito: Brian Engh / dontmesswithdinosaurs.com, fornecido por Helmholtz-Zentrum Berlin fa¼r Materialien und Energie

Uma equipe conjunta de paleonta³logos analisou pela primeira vez estruturas ósseas em fa³sseis de 400 milhões de anos de vida marinha em alta resolução sem precedentes e em 3D. Para poder visualizar essas estruturas, especialistas em tomografia do Helmholtz-Zentrum Berlin (HZB) examinaram as amostras sob o feixe de a­ons focalizado de um microsca³pio eletra´nico de varredura para calcular imagens 3D dos dados, alcana§ando resoluções na faixa nanomanãtrica usando a tecnologia inicialmente desenvolvido para estudar a corrosão de baterias.

Quer sejam peixes, aves ou mama­feros, todos os vertebrados tem um esqueleto interno de ossos. Em quase todos os vertebrados (com exceção de alguns peixes ósseos), o osso consiste em um composto complexo de minerais, protea­nas e células ósseas vivas (ostea³citos) aprisionados na matriz a³ssea. As células ósseas são interconectadas por minaºsculos canais para que possam trocar substâncias e sinais eletroquí­micos, permitindo que o osso cresa§a e se regenere. Ainda assim, essa arquitetura complexa de material vivo e inorga¢nico deve ter surgido em algum ponto do curso da evolução. Uma equipe do Museum fa¼r Naturkunde Berlin chefiada pelo Dr. Florian Witzmann estãoinvestigando como e quando isso aconteceu. Agora eles descobriram um possí­vel marco neste desenvolvimento.

Eles examinaram amostras fossilizadas de armadura a³ssea de duas primeiras espanãcies de peixes que viveram cerca de 400 milhões de anos atrás. Uma amostra veio de Tremataspis mammillata, um peixe sem manda­bulaque viveu no final do período Siluriano hácerca de 423 milhões de anos e pertence ao grupo extinto denominado Osteostraci. A segunda amostra, muito mais jovem, foi um pedaço de osso do peixe Bothriolepis trautscholdi que viveu no final do período Devoniano hácerca de 380 milhões de anos e pertence ao extinto Placodermi, o primeiro grupo de peixes com manda­bula. “Já se sabia que esses primeiros vertebrados tinham células ósseas, mas saba­amos pouco sobre como as células se conectavam entre si, bem como sobre a estrutura detalhada da lacuna, ou cavidade, em que as células ósseas estavam localizadas o animal vivo. Para podermos fazer afirmações mais precisas sobre o metabolismo ósseo, precisa¡vamos ter imagens muito mais detalhadas dessas estruturas do que as disponí­veis anteriormente ", diz Witzmann.

Para conseguir isso, o especialista em HZB, Dr. Ingo Manke, sugeriu um manãtodo que estãodispona­vel no campus do HZB em Wannsee no Laborata³rio de Microscopia Eletra´nica: tomografia por microscopia eletra´nica de varredura por feixe de a­ons (FIB-SEM) focada no ZEISS Crossbeam 340. Neste dispositivo , um feixe de a­on de ga¡lio focalizado remove continuamente o material dasuperfÍcie da amostra, cavando gradualmente seu caminho mais profundamente na amostra. Ao mesmo tempo, um feixe de elanãtrons varre a parte recanãm-revelada da amostra e fornece dados para a criação de imagens 3D em uma resolução cem vezes mais precisa do que a tomografia computadorizada.

Usando uma rede neural treinada com eletrodos de bateria, os cientistas do HZB
conseguiram calcular imagens 3D de amostras de ossos fa³sseis com resoluções
em escala nanomanãtrica. Crédito: HZB

A equipe de Manke já havia usado esse manãtodo para estudar materiais de eletrodo para baterias, que possuem uma rede de caminhos finos para transportar a­ons. O fa­sico do HZB, Markus Osenberg, havia empregado anteriormente um sofisticado procedimento de avaliação desenvolvido no Laborata³rio de Ana¡lise 3D do HZB para calcular a imagem a partir dos dados de medição. Esta éuma rede neural especialmente treinada, um manãtodo emprestado do aprendizado de ma¡quina, porque as imagens desses tipos de amostras não podem ser calculadas usando manãtodos padra£o. “Devido aos inúmeros caminhos atravanãs do osso, asuperfÍcie da amostra étão cheia de buracos quanto um queijo suiço”, explica Osenberg, que estãofazendo seu doutorado na equipe de Manke. No entanto, após alguma prática , a rede neural bem treinada reconhece onde corre o plano da ablação e onde estãoos buracos, e reconstra³i uma imagem precisa dasuperfÍcie ablacionada. "Na verdade, as estruturas nas amostras de osso são relativamente semelhantes a s estruturas nos materiais dos eletrodos das baterias. Mas o fato de que a rede neural, que aprendeu com os materiais das baterias, agora também pode criar imagens das amostras de ossos fa³sseis tão bem nos surpreendeu, "diz Osenberg.
 
Mesmo na amostra mais antiga do peixe com armadura sem manda­bula, as imagens 3D exibem uma rede complexa com cavidades (lacunas) para as células ósseas e minaºsculos canais atravanãs do osso interconectando essas cavidades. “Os canais são mil vezes mais estreitos do que um fio de cabelo humano e, no entanto, surpreendentemente, foram quase completamente preservados ao longo desses 400 milhões de anos”, diz Manke.

A análise elaborada das imagens 3D de alta resolução mostra em detalhes como a rede foi construa­da de cavidades (lacunas) e os canais entre elas. "Isso prova que nossos primeiros ancestrais, ainda sem manda­bula, já possua­am ossos caracterizados por uma estrutura interna semelhante a  nossa e provavelmente por muitas capacidades fisiola³gicas semelhantes também", explica Witzmann. "O achado paleobiola³gico mais importante éque também podemos detectar traa§os reais de metabolismo nessas primeiras amostras de ossos", disse Yara Haridy, que estãofazendo seu doutorado. no Museum fa¼r Naturkunde Berlin. Por meio da ostea³lise local, ou seja, da dissolução da matriz a³ssea que circundava as células ósseas, o organismo provavelmente foi capaz de suprir sua necessidade de fa³sforo em tempos de escassez. Isso lhe deu uma vantagem sobre seus contempora¢neos mais primitivos,

"Essa vantagem aparentemente levou ao estabelecimento generalizado de ossos com células ósseas em vertebrados, como conhecemos também em humanos. a‰ um passo importante para entender como surgiu o nosso pra³prio metabolismo ósseo", explica Haridy. "Mesmo no osso fa³ssil inicial, as células ósseas podiam dissolver e restaurar os minerais ósseos. Isso significa que os pra³prios ossos agem como baterias, armazenando minerais e liberando-os mais tarde! Essa capacidade forneceu uma vantagem indiscuta­vel para peixes sem manda­bula com células ósseas sobre vertebrados sem. Esta vantagem foi possivelmente tão profundo que alterou a evolução dos vertebrados, visto que mais tarde vertebrados com manda­bulas retiveram células ósseas . "

O estudo foi publicado na Science Advances .

 

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