Devemos entender esse momento como um ponto de partida, para que não tenhamos mais dias tão tristes, fazendo perdurar por todo o ano o Setembro Amarelo, a campanha brasileira de prevena§a£o ao suicadio.
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Na Universidade, entre as crises potencializadas e catalisadas pela pandemia, o suicadio éuma questãosobre a qual o debate não pode ser adiado ou calado. Na verdade, o suicadio não éalgo peculiar de uma universidade ou de umpaís. Discussaµes sobre o tema nas universidades quase que sazonalmente retornam e ganham destaque importante na comunidade acadaªmica e na sociedade. Assim, por exemplo, aconteceu na USP em 2017 e em 2018 na UnB. Hoje éa Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Em poucos meses a escola perdeu três alunos. Traªs famalias foram ceifadas de um filho ou uma filha. Amigos, professores e a instituição se questionam, e querem saber o que poderia ter sido feito.
Ha¡ despreparo em descobrir quando isso pode acontecer; como abordar a pessoa em sofrimento e como e para onde encaminha¡-la. Fato éque as causas de suicadio são várias, complexas e diversas entre si. Entretanto, quando se tem uma constante, devemos ficar em alerta.
A FFLCH éessa constante, portanto tem de transigir, tem de tentar pa´r fim a crise. O acolhimento, no que se refere ao contato, a aproximação, a atenção, a solidariedade e a generosidade, édeficita¡rio entre nós.
Isso não significa que não invistamos em políticas de permanaªncia. Contudo, nos falta uma ação conjunta, comunita¡ria e solida¡ria em favor do pra³ximo. Uma rede de pessoas que abrace os que sofrem. Algo que não seja apenas um número, mas uma condição necessa¡ria a ser aderida por todos. E isto deve transcender o ambiente da universidade.
Nosso desafio éenorme. Somos a maior unidade da USP: temos 12.600 alunos. Se a estimativa éde que 5,8% dos brasileiros estãodiagnosticados para casos de depressão, segundo a OMS, nosteraamos na FFLCH cerca de 730 jovens em situação de sofrimento, excluindo-se funciona¡rios e professores. Devemos atendaª-los, os alunos, preferencial e rapidamente.
Para enfrentar esta crise, criamos na FFLCH um grupo de emergaªncia com um largo espectro da comunidade da USP: estudantes, funciona¡rios, professores, psica³logos, pedagogos, psicanalistas, médicos, sanitaristas, sindicalistas, ativistas.
Ações foram propostas: a elaboração de uma cartilha sobre a questão; a criação de um canal de comunicação direta; a implementação de um projeto de tutoria; a criação de um grupo de acompanhamento dos moradores do Conjunto Residencial da USP (Crusp); pesquisa de avaliação sobre saúde mental; expansão das ações de permanaªncia e a organização de rodas de conversa on-line.
Crise éuma palavra associada a momentos complexos e negativos que urgem de resolução. Contudo, se observarmos sua etimologia, deriva do grego krino, cujos significados podem ser: “distinguirâ€, “separarâ€, “decidir†e “julgarâ€, o que nos impaµe o sentido positivo do termo cognato “krisis†(crise): o momento de decisão, de discernimento, de separar o joio do trigo.
​​​​​​​E assim devemos entender esse momento como um ponto de partida, para que não tenhamos mais dias tão tristes, fazendo perdurar por todo o ano o Setembro Amarelo, a campanha brasileira de prevenção ao suicadio.
As opiniaµes expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional do maisconhecer.com
Paulo Martins
Diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP