Saúde

Lipoprotea­nas produzidas em laboratório reduzem efeito ta³xico da quimioterapia
Tanãcnica desenvolvida em laboratório da USP estãosendo testada também em outras áreas, como cardiologia e transplante de órgãos
Por Ivanir Ferreira - 12/03/2020


Injetada na corrente sanguínea, a Low Density Emulsion (LDE), como foi
identificada, neutraliza a toxicidade dos quimiotera¡picos, atingindo seletivamente
as células tumorais osFotomontagem sobre imagem Eduardo Cesar
via Revista Fapesp / CC-BY-NC-ND

Uma lipoprotea­na artificial, espanãcie de “vea­culo” para levar o fa¡rmaco, pode reduzir a toxicidade da quimioterapia, mostraram testes  em pacientes com câncer que não responderam ao tratamento convencional. Injetada na corrente sanguínea, a Low Density Emulsion (LDE), como foi identificada,  neutraliza a toxicidade dos quimiotera¡picos, atingindo seletivamente as células tumorais. Quem vem liderando as pesquisas éo médico endocrinologista Raul Cavalcante Maranha£o, diretor do Laborata³rio de Metabolismo e La­pides do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Cla­nicas da Faculdade de Medicina (FM) da USP.

O professor Maranha£o estãoenvolvido nessas pesquisas hámais de 25 anos. A patente dessa parta­cula artificial criada no laboratório do InCor foi concedida ao médico em 1997, nos Estados Unidos. Atualmente, aqui na USP, ele vem acompanhando oito doutorados e um mestrado acadêmico com perspectivas de aplicação dessa técnica também em outras áreas da medicina, como a cardiologia e transplante de órgãos.

O trabalho mais recente foi a tese Estudo prospectivo de fase 1/2 para avaliação da maior dose tolera¡vel, toxicidade, farmacocinanãtica e eficácia do LDE-Etoposide no condicionamento do transplante alogaªnico de células-tronco hematopoianãticas de pacientes com Leucemia Mieloide Aguda, da médica hematologista Sandra Serson Rhor, da Universidade Federal de Sa£o Paulo (Unifesp), que teve a co-orientação de Maranha£o e orientação do professor JoséSalvador. Em seu trabalho, Sandra avaliou a dose tolera¡vel da LDE em transplantes de pacientes com Leucemia Mieloide Aguda (LMA).


A LDE possui estrutura semelhante a  LDL colesterol que éavidamente atraa­da pelas células cancera­genas para sua multiplicação. O pesquisador explica como acontece o funcionamento dessas nanoparta­culas lipa­dicas. Sua equipe descobriu que, quando injetadas na corrente sanguínea, as LDEs são capazes de se ligar aos receptores que introduzem o LDL nas células cancera­genas, que tem o número de receptores bastante aumentado durante a doena§a. As células cancera­genas necessitam de muitas lipoprotea­nas (LDL) para se multiplicar, “mas a LDE tem 30 vezes mais afinidade de se ligar a  canãlula cancera­gena do que o LDL natural”, diz.

Ao longo dos últimos anos, a LDE foi testada em ratos e também em pacientes com vários tipos de ca¢ncer, em estado terminal, e que já haviam passado por um ou mais tipos de tratamentos quimiotera¡picos, sem resultados satisfata³rios. Ao todo, cerca de 250 pessoas foram beneficiadas. Segundo o professor Maranha£o, a LDE carrega seletivamente drogas quimiotera¡picas para o interior das células malignas, poupando assim as células sauda¡veis dos efeitos colaterais dos medicamentos. “Sua capacidade de direcionar e concentrar drogas nos tumores éenorme: de cinco a dez vezes, para câncer de mama, e cinquenta vezes para Leucemia Mieloide Aguda [LMA]”, diz.

O pesquisador chama a atenção para o câncer de medula a³ssea, o LMA, porque as chances de cura com quimioterapia convencional em transplante de medula a³ssea são baixa­ssimas, de apenas 25%, e os efeitos colaterais das drogas são devastadores. Na pesquisa conduzida pela doutora Sandra, onde a LDE foi usada na quimioterapia, o porcentual de sobrevida subiu para 66%. “Conseguimos reduzir drasticamente os efeitos colaterais da quimioterapia, sem que houvesse diminuição da ação farmacola³gica das drogas”, comemora.

Drogas associadas a  LDE

Os efeitos de baixa toxicidade foram observados em todas as drogas associadas a  LDE utilizadas para combater diversos tipos de ca¢ncer: LDE-paclitaxel, LDE-carmustina, LDE-etoposideo, LDE-metotrexato, LDE-daunorrubicina e LDE-docetaxel.

No artigo Phase II study of paclitaxel associated with lipid core nanoparticles (LDE) as third-line treatment of patients with epithelial ovarian carcinoma, publicado na revista cienta­fica Medical Oncology, foi descrito o tratamento de pacientes com carcinoma de ova¡rio, um tipo de câncer extremamente agressivo. As mulheres que passaram por essa experiência já haviam sido tratadas anteriormente com duas ou três linhas diferentes de quimiotera¡picos, sem resultado positivo. Com o uso da LDE-paclitaxel, 30% delas não tiveram progressão do tumor por pelo menos seis meses, o que éinanãdito, afirma o pesquisador. Este estudo foi conduzido pela médica Silvia Graziani, do Instituto do Ca¢ncer Arnaldo Vieira de Carvalho.

Na USP, as pesquisas com as lipoprotea­nas seguem em um projeto tema¡tico da Fundação de Amparo a  Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp) pelo Laborata³rio de Metabolismo e La­pides da USP. Além do ca¢ncer, a LDE tem demonstrado eficácia em tratamentos da aterosclerose, infarto agudo de mioca¡rdio, endometriose e transplantes do coração, ainda na fase de experimentação animal ou ini­cio dos estudos em pacientes. Poranãm, Maranha£o explica que, para serem produzidas em escala industrial, as lipoprotea­nas ainda precisariam passar por outros testes com número maior de pessoas, para aprovação nas agaªncias regulata³rias.

 

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