Saúde

Mulheres foram mais afetadas emocionalmente pela pandemia
Elas apresentaram mais sintomas de depressão, de ansiedade e de estresse; na populaa§a£o como um todo, houve abusos de drogas, medicamentos e alimentos
Por Ivanir Ferreira - 10/02/2021


O estudo foi feito no Instituto de Psiquiatria da USP. Das volunta¡rias que responderam a pesquisa, 40,5% apresentaram sintomas de depressão, 34,9%, ansiedade, e 37,3%, estresse - Arte Moisanãs Dorado sobre foto de Marcos Santos/USP Imagens

A pandemia impactou a saúde mental e aspectos comportamentais dos brasileiros. Um estudo realizado entre maio e junho de 2020 com homens e mulheres de várias regiaµes do Paa­s (26 Estados brasileiros e do Distrito Federal) mostrou que um número grande de pessoas apresentou, durante a pandemia, sintomas de depressão, ansiedade e estresse. Houve também maior consumo de drogas ila­citas, de cigarros, de medicamentos e de alimentos. As mais afetadas emocionalmente foram as mulheres, respondendo por 40,5% de sintomas de depressão, 34,9% de ansiedade e 37,3% de estresse. A pesquisa ouviu três mil voluntários e foi conduzida pela equipe do neuropsica³logo Anta´nio de Pa¡dua Serafim, do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Cla­nicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).

“Embora a pesquisa não tenha detalhado as razões que levaram as mulheres a terem maior sofrimento psa­quico, a literatura médica vem mostrando que são elas que tem maiores impactos pelas condições sociais em que vivem. A pandemia são acirrou essa situação”, diz o neuropsica³logo. Elas cumprem dupla jornada, acompanham o desenvolvimento escolar dos filhos e, na pandemia, mais pessoas permaneceram dentro de casa, além das preocupações relacionadas ao pra³prio va­rus (iminaªncia de contaminação, necessidade demudanças de hábitos de higiene, redução de conva­vio social, familiares adoecidos, etc.). “Todas essas circunsta¢ncias geram estresse e podem ser gatilhos detonadores de doenças mentais”, explica o professor Pa¡dua Serafim. O resultado da pesquisa foi publicado dia 3 de fevereiro na Plos One sob o ta­tulo

Além do perfil de mulher multitarefa que concilia trabalhos domanãsticos e vida profissional, a pesquisa trouxe um achado interessante que revela outra face da questãode gaªnero. O sofrimento psa­quico também atingiu quem morava sozinha e não tinha filhos. Os na­veis mais elevados de estresse, depressão e ansiedade foram relatados por mulheres nestas condições, situação que, segundo o estudo, provavelmente estivesse associada a outras varia¡veis consideradas pela pesquisa e que poderiam estar contribuindo para o adoecimento das entrevistadas: muitas delas estavam desempregadas, tinham hista³rico de doenças crônicas (25,9%) e relataram ter tido contato com pessoas com diagnóstico de covid-19 (35,2%).

Uma das hipa³teses levantadas pelo pesquisador foi que a pandemia tenha deixado esse grupo mais vulnera¡vel a um estado de falta de perspectivas e incertezas quanto ao futuro, o que teria causado mais sensações de desconforto, angaºstia, ansiedade e desamparo.

Capacidade adaptativa a situações de estresse

Segundo o pesquisador, o estudo explorata³rio teve o objetivo de investigar a capacidade de enfrentamento das pessoas na pandemia e como elas se ajustariam a situações de pressão. “Em uma pandemia, como estamos vivendo, as pessoas tendem a ficar mais suscetíveis amudanças físicas, cognitivas, comportamentais e emocionais, o que poderia trazer impacto direto em sua saúde mental”, diz.

A pesquisa abrangeu o período de 22 de maio a 5 de junho de 2020 e usou questiona¡rio pela plataforma Google Forms, com informações sociodemogra¡ficas (idade, estado civil, quantidade de filhos, escolaridade, número de pessoas que viviam na residaªncia, etc.), e sobre as condições gerais de saúde dos participantes (sobre o conta¡gio da covid-19, morte de parentes ou amigos e o comportamento diante das demandas geradas pela pandemia). A avaliação dos sintomas psicola³gicos foi feita utilizando uma escala chamada DASS-21, que possibilita verificar prevalaªncias de sintomas de depressão, ansiedade e estresse.


Consumo de a¡lcool ou de, pelo menos, um tipo de droga evidenciado na pesquisa podera£o
se agravar no pa³s-pandemia - Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Consumo maior de drogas, a¡lcool, cigarros e alimentos

Das 3 mil pessoas que responderam ao questiona¡rio, 83% eram mulheres, casadas (50,6%), tinham formação universita¡ria (70,1%) e estavam empregadas (46%). Do grupo geral, incluindo homens e mulheres, 6,4% contraa­ram o va­rus e 22,7% possua­am amigos ou parentes que tinham ido a a³bito pela doena§a. Com relação aos dados comportamentais, 40,8% teve maior consumo de drogas ila­citas, de cigarros, medicamentos e alimentos, e quase metade dos participantes expressou ter tido sintomas de depressão (46,4%), ansiedade (39,7%) e estresse (42,2%).

Na avaliação do neuropsica³logo, o resultado demonstrou que as pessoas não tiveram respostas positivas e adaptativas a  pandemia, o que significa que os problemas evidenciados pela pesquisa (condições cla­nicas) podera£o se agravar e persistir no pa³s-pandemia. Quanto a  existaªncia de um grupo mais vulnera¡vel a situações de alta carga de estresse (no caso das mulheres), a recomendação éque haja maior atenção do sistema de saúde mental para esse grupo mais vulnera¡vel durante e após a pandemia.

Estratanãgias de enfrentamento comportamentais

Segundo o estudo, estratanãgias de enfrentamento de estresse são recursos utilizados pelas pessoas diante de um problema, podendo eles serem positivos ou negativos. Os resultados apresentados pela pesquisa indicam que os comportamentos adotados pelos participantes na pandemia foram negativos e de fuga-evitação. Passaram a consumir mais alimentos e abusaram de drogas, de tabaco e medicamentos. “Tais estratanãgias, geralmente, envolvem pessoas que imaginam possa­veis soluções para um problema, sem, no entanto, tomar medidas para muda¡-lo”, relata.

O professor Pa¡dua Serafim ressalta que esses achados são preliminares, retratam um momento vivido pelos brasileiros e entende que a magnitude dos impactos na saúde mental são serámais bem conhecida com estudos conta­nuos após o relaxamento total da quarentena. No entanto, diz que pesquisas que abordam sinais comportamentais relacionados a  ansiedade, depressão e estresse associados a  covid-19 levantam um alarme importante para os servia§os paºblicos de saúde, que precisam estar preparados para o aumento da demanda e urgência no tratamento de novos casos de doença mental, conclui.

 

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