Saúde

Coronava­rus infecta e se replica em células das gla¢ndulas salivares
A descoberta foi feita por pesquisadores da USP por meio de análise de amostras de gla¢ndulas salivares de pacientes que morreram por covid-19
Por Elton Alisson - 01/07/2021


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Pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) constataram que o sars-cov-2 infecta e se replica em células das gla¢ndulas salivares. Por meio de análises de amostras de três tipos de gla¢ndulas salivares, obtidas durante um procedimento de auta³psia minimamente invasiva em pacientes que morreram em decorraªncia de complicações da covid-19 no Hospital das Cla­nicas da FMUSP, eles verificaram que esses tecidos especializados na produção e secreção de saliva são reservata³rios para o novo coronava­rus. Os resultados do estudo, apoiado pela Fundação de Amparo a  Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp), foram publicados no Journal of Pathology.

As descobertas contribuem para explicar por que o novo coronava­rus éencontrado em grandes quantidades na saliva, o que viabilizou a realização de testes para diagnósticos da covid-19 a partir do fluido, relatam os autores do trabalho.

“a‰ o primeiro relato de va­rus respirata³rio capaz de infectar e se replicar nas gla¢ndulas salivares. Atéentão, acreditava-se que apenas va­rus causadores de doenças com prevalaªncia muito alta, como o da herpes, usavam as gla¢ndulas salivares como reservata³rio. Isso pode ajudar a explicar por que o sars-cov-2 étão infeccioso”, disse a  Agência Fapesp Bruno Fernandes Matuck, doutorando na Faculdade de Odontologia (FO) da USP e primeiro autor do estudo.

Os pesquisadores já tinham demonstrado, em estudo anterior, a presença de RNA do sars-cov-2 no tecido periodontal de pacientes que morreram em decorraªncia da Covid-19. Em razãoda alta infecciosidade do sars-cov-2 quando comparado a outros va­rus respirata³rios, eles levantaram a hipa³tese de que o novo coronava­rus poderia infectar e se replicar em células das gla¢ndulas salivares e, dessa forma, surgir na saliva sem ter contato com secreções nasais e pulmonares.

Isso porque estudos internacionais anteriores mostraram que o ducto salivar apresenta o receptor ACE-2, com o qual a protea­na spike do sars-cov-2 se liga para infectar as células. Mais recentemente, outros grupos de cientistas relataram ter observado em estudos feitos com animais que, além da ACE2, receptores como a serina protease transmembranar 2 (TMPRSS) e a furina, presentes nos tecidos das gla¢ndulas salivares, são alvos do sars-cov-2.

A fim de testar essa hipa³tese em humanos, foram feitas bia³psias guiadas por ultrassom em 24 pacientes que morreram em decorraªncia da Covid-19, com idade média de 53 anos, para extração de amostras de tecidos das gla¢ndulas para³tida, submandibular e menores.

As amostras dos tecidos foram submetidas a análises moleculares (RT-PCR) para identificação da presença do va­rus. Os resultados indicaram a presença do va­rus nos tecidos em mais de dois tera§os das amostras.

Já por meio de marcações imuno-histoquímicas osem que écolocado um corante em uma molanãcula que se gruda no va­rus e nos receptores –, foi possí­vel observar a presença do va­rus in situ, no interior dos tecidos. E, por meio de microscopia eletra´nica, foi detectada não são a presena§a, mas também o va­rus se replicando nas células e identificado o tipo de organela que ele utiliza para essa finalidade.

“Observamos vários va­rus aglomerados nas células das gla¢ndulas salivares osum indicativo de que estãose replicando em seu interior. Nãoestavam presentes nessas células passivamente”, afirma Matuck.

Boca como porta de entrada direta

Os pesquisadores pretendem avaliar, agora, se a boca pode ser uma porta de entrada direta do sars-cov-2, uma vez que os receptores ACE2 e o TMPRSS são encontrados em vários locais da cavidade, como em tecidos da gengiva e da mucosa bucal. Além disso, a boca tem uma área de contato maior do que a cavidade nasal, apontada como a principal porta de entrada do va­rus.

“Por meio de uma parceria com pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte, dos Estados Unidos, pretendemos mapear a distribuição desses receptores na boca e quantificar as replicações virais em tecidos bucais”, diz Luiz Fernando Ferraz da Silva, professor da FMUSP e coordenador do projeto.

“Pode ser que a boca seja um meio via¡vel para entrada direta do va­rus”, estima Matuck.

Outra ideia éverificar se idosos possuem mais receptores ACE2 na boca em comparação com pessoas mais jovens, uma vez que tem uma diminuição do fluxo salivar. A despeito disso, os pesquisadores encontraram mesmo em pacientes idosos, que tem menos tecidos salivares, uma alta carga viral.

“Esses pacientes quase não tinham tecido salivar, era quase tudo tecido gorduroso. Mas, mesmo assim, ainda apresentavam uma carga viral relativamente alta”, relata Matuck.

O artigo Salivary glands are a target for Sars-CoV-2: a source for saliva contamination  tem  autoria de Bruno Fernandes Matuck, Marisa Dolhnikoff, Amaro Nunes Duarte-Neto, Gilvan Maia, Sara Costa Gomes, Daniel Isaac Sendyk, Amanda Zarpellon, Nathalia Paiva de Andrade, Renata Aparecida Monteiro, Joa£o Renato Rebello Pinho, Michele Soares Gomes-Gouvaªa, Suzana COM Souza, Cristina Kanamura, Thais Mauad, Paulo Hila¡rio Nascimento Saldiva, Paulo H Braz-Silva, Elia Garcia Caldini e Luiz Fernando Ferraz da Silva.

Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licena§a Creative Commons CC-BY-NC-ND.

 

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