Modelo que explica ejea§a£o de gás em alta velocidade pelos buracos negros pode ajudar a entender a evolua§a£o das gala¡xias
Astrofasicos do Instituto de Astronomia, Geofasica e Ciências Atmosfanãricas da USP propaµem modelo universal para explicar ejeção de matéria ao redor dos buracos negros. Isso pode ajudar a entender evolução das gala¡xias; na imagem, a gala¡xia espiral NGC 1068 osIlustração: Nasa / ESA / A. van der Hoeven
Na imaginação popular, buracos negros são objetos misteriosos que engolem tudo ao seu redor. Mas, segundo a ciaªncia, buracos negros expulsam muito mais matéria do seu entorno, atémil vezes mais do que capturam. Entender os mecanismos que regem a ejeção e a captura de matéria por buracos negros supermassivos éo desafio de pesquisadores do Instituto de Astronomia, Geofasica e Ciências Atmosfanãricas (IAG) da USP. Em seu estudo mais recente, descrito em artigo publicado no peria³dico especializado Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (MNRAS), os cientistas propaµem um modelo universal que explica como acontece a ejeção de matéria ao redor dos buracos negros. A pesquisa, ao abordar a ejeção de gás em alta velocidade, pode ajudar a entender a evolução das gala¡xias.
“A maneira como buracos negros ejetam matéria anã, por mais estranho que parea§a, a mesma como eles a capturam: atravanãs de um disco de gás, chamado ‘disco de acreção’, espiralando para dentro do buraco negroâ€, explica Daniel May, pa³s-doutorando em Astronomia do IAG. “Tanto a pressão da radiação luminosa do disco quanto o par de jatos departículas a s vezes criado interagem com a matéria que se acumulou ao redor do buraco negro, soprando-a para distâncias muito maiores.†Esse fena´meno échamado de outflow.
Uma das questões que intrigam os astrofisicos éentender a origem da matéria ejetada no outflow e como ela atinge velocidades de centenas de quila´metros por segundo. Por isso, junto com o professor Joa£o Steiner – que morreu no último dia 10 de setembro e foi um dos grandes pesquisadores na área de buracos negros osalém de colaboradores da Universidade Federal do ABC, da Universidade de Oxford (Reino Unido) e da Universidade de Xiamen (China), May utilizou dados de espectroscopia 3D do telesca³pio Gemini Norte (localizado no Havaa) para detalhar o movimento de gases ao redor do núcleo ativo da gala¡xia NGC 4151, uma gala¡xia próxima da Via La¡ctea que ébastante estudada.
A gala¡xia NGC 4151 possui um buraco negro supermassivo em seu centro, como éesperado para todas as gala¡xias, e a presença de um disco de acreção éjustamente o que a define como uma gala¡xia de núcleo ativo (AGN). Ha¡ duas formas distintas de gás ao redor do AGN. A parte ionizada, exposta ao AGN e com altas velocidades, caracteriza o outflow. A parte molecular, normalmente fora da regia£o de onde se vaª o gás ionizado e com velocidades mais baixas, caracteriza o que pode vir a alimentar o AGN.
Imagem da gala¡xia NGC 4151, com um zoom no seu centro. O carculo central delimita
a regia£o estudada na pesquisa (que estãomostrada na Figura 2), na qual o gás ejetado
se propaga com altas velocidades e atinge distâncias muito maiores osIlustrações:
Adam Block/Mount Lemmon SkyCenter/University
of Arizona e Judy Schmidt/Flickr
Fases do gás
“Conseguimos relacionar diferentes fases do gás, atéentão desconexas entre si, e encaixar suas morfologias em um aºnico cena¡rioâ€, resume May. “O que verificamos éque a estrutura molecular, mesmo parecendo ter uma dina¢mica tão diferente, também faz parte do outflow. E isso muda tudo, pois passamos a ter muito mais matéria sendo soprada.â€
Na NGC 4151, o gás ionizado surge da fragmentação desse gás molecular, que forma uma cavidade em torno do AGN. Esta cavidade, por sua vez, éuma bolha quente em expansão, empurrando o gás molecular para fora, enquanto se fragmenta. O gás ionizado que vem desta fragmentação éentão detectado se movendo rapidamente em direções opostas, enquanto a bolha évista somente de perfil e, por isso, em baixa velocidade.
Aesquerda, imagem do gás molecular (em cinza) e do gás ionizado (azul e vermelho);
a direita, esquema proposto para a gala¡xia NGC 4151, com as paredes da cavidade
molecular (em preto), carculos representando bolhas de gás compacto se afastando
(em vermelho) e se aproximando (em azul) e a regia£o clara mostrando a emissão de
gás de alta velocidade osGra¡fico: May et al., com dados do instrumento NIFS
(Near Integral Field Spectrograph) do Telescópio
Gemini Norte e May et al.
Mas a parte mais interessante das conclusaµes obtidas a partir da observação da gala¡xia NGC 4151 éque todos esses mecanismos já haviam sido encontrados por May quando ele estudou outra gala¡xia, em 2017. A gala¡xia estudada anteriormente, NGC 1068, tem um AGN 50 vezes mais potente do que o da NGC 4151. Isso sugere que o mecanismo para desencadear o outflow não éespecafico de uma única gala¡xia, e que se aplica em gala¡xias de caracteristicas distintas entre si.
“Levantou-se, então, uma hipa³tese promissora a respeito da origem do gás no outflow e como ele éjogado para fora do núcleo com tanta eficiência, o que éuma pea§a-chave para explicarmos como as gala¡xias evoluaram no Universoâ€, conclui May. Segundo essa hipa³tese, a energia para expulsar a matéria do núcleo pode vir dos momentos iniciais do outflow, uma vez que, no passado, este gás molecular em expansão estaria muito mais pra³ximo do buraco negro.
Para o astrofisico, a verificação dessa hipa³tese pode acontecer com os futuros telesca³pios, como o ELT e o GMT, que sera£o capazes de “enxergar†melhor o que acontece no coração dessas gala¡xias e procurar diretamente por esses esta¡gios iniciais de outflow. A pesquisa de Daniel May recebe financiamento da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp). Os resultados do estudo são apresentados no artigo The nuclear architecture of NGC 4151: on the path toward a universal outflow mechanism in light of NGC 1068, publicado no peria³dico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society em 4 de junho.
No último dia 6 de outubro, a Academia Real das Ciências da Suanãcia anunciou que os cientistas Roger Penrose, Reinhard Genzel e Andrea Ghez são os ganhadores do Praªmio Nobel 2020 de Fasica, por suas descobertas sobre buracos negros. Roger Penrose, professor da Universidade de Oxford (Reino Unido), demonstrou que a formação de buracos negros estãorelacionada com a teoria geral da relatividade. Andrea Ghez, da Universidade da Califórnia em Berkeley (Estados Unidos), e Richard Genzel, do Instituto Max Planck para Fasica Extraterrestre (Alemanha), identificaram um buraco negro supermassivo na Via La¡ctea, gala¡xia onde estãolocalizado o Sistema Solar, o qual comprova a tese de Penrose.