Tecnologia Científica

USP e Unesp produzem tecnologia que elimina corante e metal cancera­geno da a¡gua
A membrana filtra e degrada substâncias ta³xicas que não são identificadas pelas estaa§aµes de tratamento de a¡gua
Por Henrique Fontes - 26/11/2020


A solução representa um avanço significativo no desenvolvimento de tecnologias para a remoção simulta¢nea de contaminantes orga¢nicos (associados e organismos vivos) e inorga¢nicos da águaosFoto: Henrique Fontes

Pesquisadores do Instituto de Quí­mica de Sa£o Carlos (IQSC) da USP e do Instituto de Quí­mica (IQ) da Universidade Estatual Paulista (Unesp) criaram um novo material capaz de filtrar e degradar, simultaneamente, metal cancera­geno e corante que podem ser encontrados na a¡gua. Com a possibilidade de ser reutilizada várias vezes sem perder a efica¡cia, a tecnologia se apresenta como uma membrana, composta de celulose bacteriana revestida por uma camada de dissulfeto de molibdaªnio (MoS2), um metal que não éta³xico. Os resultados do trabalho geraram artigo publicado na revista cienta­fica norte-americana ACS Applied Materials & Interfaces.

Um dos autores da pesquisa, o professor Ubirajara Pereira Rodrigues Filho, do IQSC, explica que, para degradar os poluentes, a membrana precisa de uma fonte de luz, responsável por fornecer energia ao dissulfeto de molibdaªnio para que, por meio de algumas reações químicas, ele degrade os compostos ta³xicos conforme eles são “presos” ao material. Os cientistas do Grupo de Materiais Ha­bridos e Inorga¢nicos do IQSC, coordenado pelo docente, testaram o desempenho da tecnologia construindo um fotorreator, aparelho por onde a águaem fluxo pa´de passar pela membrana, que foi iluminada por uma la¢mpada. Apa³s duas horas de tratamento, os especialistas conseguiram remover 96% do azul de metileno (corante) e 88% do cra´mio (VI) osmetal cancera­geno. A membrana foi capaz de degradar as substâncias tanto de forma isolada como misturadas.

Inanãdita, a utilização de celulose bacteriana no desenvolvimento de tecnologias para a descontaminação da águaapresenta diversas vantagens em relação a outros materiais, como a sa­lica e dia³xido de tita¢nio, que são aplicados na forma de pa³ ou de membranas: “Além de ser uma matéria-prima renova¡vel, a celulose bacteriana permite a construção de um material mais leve, flexa­vel, resistente, com maior durabilidade e menos susceta­vel a trincas”, explica Pereira, que exaltou a releva¢ncia do estudo: “Embora nossa pesquisa ainda seja apenas uma prova de conceito e esteja em esta¡gio inicial, émuito gratificante ter a possibilidade de proporcionar a quem desenvolve as estações de tratamento de águanovas tecnologias para melhorar a qualidade de vida da população”, completa.


A membrana écomposta de celulose bacteriana revestida por uma camada de dissulfeto
de molibdaªnio (MoS2), um metal que não éta³xico osFoto: Henrique Fontes

A estrutura da membrana desenvolvida pelos pesquisadores éum tipo de aerogel, que éum gel cuja parte la­quida foi substitua­da por um gás, no caso do material feito pela USP e Unesp, o ar. Para construir a tecnologia foi preciso realizar uma sanãrie de procedimentos. Inicialmente, a partir de um grupo de bactanãrias, os especialistas obtiveram um hidrogel de celulose bacteriana, material altamente poroso e composto de aproximadamente 99% de a¡gua. Apa³s essa etapa, o produto élavado para eliminar possa­veis impurezas e, posteriormente, revestido com nanofolhas do dissulfeto de molibdaªnio. Finalmente, o material étransformado em aerogel por meio de um processo chamado secagem controlada, que substitui a águapor ar, dando forma ao produto final.

Desafio global

Compostos como tintas, metais, remanãdios, cosmanãticos e produtos de higiene pessoal estãoentre os chamados contaminantes emergentes, substâncias que podem ser encontradas em pequenas concentrações nos rios que abastecem munica­pios e chegar aténossas casas, já que as estações de tratamento de águacarecem de equipamentos adequados para removaª-los. “Ha¡ uma necessidade muito grande de desenvolver novos materiais com propriedades melhoradas e com maior aplicabilidade para a remoção eficiente de uma ampla gama de poluentes da a¡gua”, explica Elias Paiva Ferreira Neto, autor principal da pesquisa e pa³s-doutorando do IQ-Unesp.

O especialista diz que hános os contaminantes emergentes tem desafiado centenas de cientistas brasileiros e do exterior a buscarem soluções eficientes e a entenderem os impactos que eles podem gerar ao meio ambiente e aos seres vivos. Segundo o Relata³rio de Desenvolvimento Mundial da agua da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2017, mais de 80% das a¡guas residuais urbanas e industriais do mundo ose mais de 95% em algunspaíses menos desenvolvidos ossão lascadas no meio ambiente sem tratamento. O constante crescimento da população mundial, a abertura de novas indaºstrias, o aumento das atividades de agricultura, pecua¡ria e mineração são fatores que contribuem para o agravamento do cena¡rio, ameaa§ando a qualidade do abastecimento de águapota¡vel.

Elias, que se formou no IQSC, onde também realizou seu mestrado e doutorado, com orientação do professor Ubirajara, atualmente faz pa³s-doutorado no Laborata³rio de Materiais Fota´nicos do IQ-Unesp com financiamento da Fundação de Amparo a  Pesquisa do Estado de Sa£o Paulo (Fapesp). Ele explica que o estudo realizado em parceria com a USP representa um avanço significativo no desenvolvimento de tecnologias para a remoção simulta¢nea de contaminantes orga¢nicos (associados e organismos vivos) e inorga¢nicos da águaa fim de promover sua purificação, podendo ser uma importante ferramenta para estações de tratamento de efluentes das indaºstrias taªxteis e de couro do Estado de Sa£o Paulo. Nos pra³ximos passos do estudo, ele conta que pretende testar a nova membrana para a degradação de outras substâncias, como amostras de medicamentos e pesticidas. “Por se tratar de uma tecnologia simples e escala¡vel, nosesperamos que futuramente ela possa reduzir os custos do tratamento de a¡guas residuais e se tornar uma solução para mitigar os desafios ambientais”, finaliza.

O trabalho éfruto de uma parceria com o pesquisador Sidney Joséde Lima Ribeiro, professor do IQ-Unesp e supervisor de Elias, e com Fa¡bio Simaµes, docente do Departamento de Fa­sica da Unesp, em Rio Claro. O estudo também teve a participação de Sajjad Ullah, da Universidade de Peshawar, Paquistão; da doutoranda do IQSC Amanda Perissinoto; e da mestranda Thais Caroline de Almeida e do mestre Rafael Romano, ambos do IQ-Unesp.

 

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