Com base apenas na gravidade e nos dados topogra¡ficos, a espessura da crosta foi estimada entre 30 e 100 km.
Impressão artastica da estrutura interna de Marte. Crédito: © IPGP / David Ducros
Usando informações obtidas em cerca de uma daºzia de terremotos detectados em Marte pelo sisma´metro Very Broad Band SEIS, desenvolvido na Frana§a, a equipe internacional da missão InSight da NASA revelou a estrutura interna de Marte. Os três artigos publicados em 23 de julho de 2021 na revista Science, envolvendo vários coautores de instituições e laboratórios franceses, incluindo o CNRS, o Institut de Physique du Globe de Paris e a Universitéde Paris, e apoiados em particular pela agaªncia espacial francesa CNES e pela Agência Nacional de Pesquisa Francesa ANR, fornecem, pela primeira vez, uma estimativa do tamanho do núcleo do planeta, da espessura de sua crosta e da estrutura de seu manto, a partir da análise das ondas sasmicas refletidas e modificadas por interfaces em seu interior. Isso torna esta a primeira exploração sasmica da estrutura interna de um planeta terrestre diferente da Terra, e um passo importante para a compreensão da formação e evolução tanãrmica de Marte.
Antes da missão InSight da NASA, a estrutura interna de Marte ainda era mal compreendida. Os modelos foram baseados apenas em dados coletados por satanãlites em a³rbita e na análise de meteoritos marcianos que caaram na Terra. Com base apenas na gravidade e nos dados topogra¡ficos, a espessura da crosta foi estimada entre 30 e 100 km. Os valores do momento de inanãrcia e densidade do planeta sugeriram um núcleo com raio de 1.400 a 2.000 km. A detalhada estrutura interna de Marte e a profundidade dos limites entre a crosta, o manto e o núcleo eram, no entanto, completamente desconhecidos.
Com a implantação bem-sucedida do experimento SEIS nasuperfÍcie de Marte no inicio de 2019, os cientistas da missão, incluindo os 18 coautores franceses envolvidos e afiliados a uma ampla gama de instituições e laboratórios franceses, juntamente com seus colegas da ETH em Zurique, a Universidade de Cola´nia e o Laborata³rio de Propulsão a Jato em Pasadena, coletaram e analisaram dados sasmicos ao longo de um ano marciano (quase dois anos terrestres).
Deve-se ressaltar que para determinar simultaneamente um modelo estrutural, o tempo (de chegada) de um terremoto e sua distância, geralmente énecessa¡rio mais de uma estação. No entanto, em Marte, os cientistas tem apenas uma estação, a InSight. Portanto, era necessa¡rio pesquisar nos registros sasmicos os traa§os caracterasticos das ondas que haviam interagido de várias maneiras com as estruturas internas de Marte, identifica¡-las e valida¡-las. Essas novas medições, aliadas a modelagem minerala³gica e tanãrmica da estrutura interna do planeta, permitiram superar a limitação de se ter uma estação única. Este manãtodo inaugura uma nova era para a sismologia planeta¡ria.
Uma única estação, várias descobertas
Outra dificuldade em Marte ésua baixa sismicidade e o ruado sasmico gerado por sua atmosfera. Na Terra, os terremotos são muito mais fortes, enquanto os sisma³grafos são mais efetivamente localizados em cofres ou no subsolo, possibilitando a obtenção de uma imagem precisa do interior do planeta. Como resultado, atenção especial deve ser dada aos dados. "Mas, embora os terremotos marcianos tenham uma magnitude relativamente baixa, inferior a 3,5, a sensibilidade muito alta do sensor VBB combinada com o ruado muito baixo ao anoitecer nos permitiu fazer descobertas que, hádois anos, pensa¡vamos que são seriam possaveis com terremotos com uma magnitude superior a 4 ", explica Philippe Lognonnanã, professor da Universidade de Paris e investigador principal do instrumento SEIS no IPGP.
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Todos os dias, os dados, processados ​​pelo CNES, IPGP e CNRS, e transferidos para os cientistas, eram cuidadosamente limpos do ruado ambiente (vento e deformações relacionadas commudanças bruscas de temperatura). A equipe internacional do Mars Quake Service (MQS) registrou os eventos sasmicos diariamente: Mais de 600 já foram catalogados, dos quais mais de 60 foram causados ​​por terremotos relativamente distantes.
Cerca de dez destes últimos contem informações sobre a estrutura profunda do planeta: "As ondas sasmicas diretas de um terremoto são um pouco como o som de nossas vozes nas montanhas: elas produzem ecos. E foram esses ecos, refletidos no núcleo, ou na interface crosta-manto ou mesmo nasuperfÍcie de Marte, que procuramos nos sinais, graças a sua semelhança com as ondas diretas â€, explica Lognonnanã.
Uma crosta alterada, um manto revelado e um grande núcleo laquido
Ao comparar o comportamento das ondas sasmicas a medida que percorriam a crosta antes de chegar a estação InSight, foram identificadas várias descontinuidades na crosta: A primeira, observada a cerca de 10 km de profundidade, marca o limite entre uma estrutura altamente alterada, resultante de circulação de fluido hámuito tempo, e crosta que estãoapenas ligeiramente alterada. Uma segunda descontinuidade a cerca de 20 km para baixo, e uma terceira, menos pronunciada a cerca de 35 km, lana§am luz sobre a estratificação da crosta abaixo do InSight: "Para identificar essas descontinuidades, usamos todos os manãtodos analaticos mais recentes, ambos com terremotos de origem tecta´nica e com vibrações causadas pelo ambiente (ruado sasmico) ", diz Benoit Tauzin, professor titular da Universidade de Lyon e pesquisador do LGL-TPE.
No manto, os cientistas analisaram as diferenças entre o tempo de viagem das ondas produzidas diretamente durante o terremoto e o das ondas geradas quando essas ondas diretas eram refletidas nasuperfÍcie. Essas diferenças possibilitaram, em uma única estação, determinar a estrutura do manto superior e, em particular, a variação das velocidades sasmicas com a profundidade. No entanto, essas variações na velocidade estãorelacionadas a temperatura. "Isso significa que podemos estimar o fluxo de calor de Marte, que éprovavelmente três a cinco vezes menor do que o da Terra, e colocar restrições na composição da crosta marciana, que se acredita conter mais da metade dos elementos radioativos produtores de calor presentes em o planeta ", acrescenta Henri Samuel, pesquisador do CNRS do IPGP.
Finalmente, no terceiro estudo, os cientistas procuraram ondas refletidas nasuperfÍcie do núcleo marciano, cuja medição de raio foi uma das principais conquistas da missão InSight. "Para fazer isso", explica Manãlanie Drilleau, engenheira de pesquisa do ISAE-SUPAERO, "testamos vários milhares de modelos de manto e núcleo em relação a s fases e sinais observados." Apesar das baixas amplitudes dos sinais associados a s ondas refletidas (conhecidas como ondas ScS), foi observado um excesso de energia para os testemunhos com raio entre 1.790 km e 1.870 km. Um tamanho tão grande implica a presença de elementos leves no núcleo laquido e tem consequaªncias importantes para a mineralogia do manto na interface manto / núcleo.
Metas alcana§adas, novas questões surgem
Mais de dois anos de monitoramento sasmico resultaram no primeiro modelo da estrutura interna de Marte, atéo núcleo. Marte, assim, junta-se a Terra e a Lua no seleto clube de planetas e luas terrestres cujas estruturas profundas foram exploradas por sisma³logos. E, como costuma acontecer na exploração planeta¡ria, novas questões surgem: A alteração dos 10 km superiores da crosta égeral ou estãolimitada a zona de aterrissagem do InSight? Que impacto esses primeiros modelos tera£o nas teorias da formação e evolução tanãrmica de Marte, em particular para os primeiros 500 milhões de anos quando Marte tinha águalaquida em suasuperfÍcie e intensa atividade vulcânica ?
Com a extensão de dois anos da missão InSight e a energia elanãtrica adicional obtida após a limpeza bem-sucedida de seus painanãis solares realizada pelo JPL, novos dados devem consolidar e melhorar ainda mais esses modelos.